— Você é terrivelmente pequena para estar num lugar como este —
disse o homem a dois bancos de distância.
— Um lugar como o quê? — perguntou Anthony, erguendo uma
sobrancelha enquanto praticamente esmagava um copo.
O homem o ignorou.
— Não sou pequena — falei antes de tomar um gole. — Sou mignon.
— Não é a mesma coisa?
— Também tenho uma arma de choque na bolsa e um gancho de
esquerda perigoso, então não força a barra.— Seu kung fu é forte.
Não dei ao cara o prazer da minha atenção. Em vez disso, olhei para
frente.
— Isso foi um comentário racista?
— Claro que não. Você só me parece meio violenta.
— Não sou violenta — falei, embora fosse melhor que parecer um alvo
fácil, sem graça.
— Ah, é mesmo? — Ele não estava perguntando. Estava me
enfrentando. — Andei lendo sobre líderes pacifistas asiáticas que receberam
homenagens. Imagino que você não é uma delas.
— Também sou irlandesa — resmunguei.
Ele deu uma risadinha. Havia algo em sua voz — não só ego, porém
mais que confiança. Algo que me fazia querer virar e dar uma boa conferida
nele, mas mantive os olhos na prateleira de garrafas do outro lado do
balcão.
Depois que o homem se deu conta de que não ia conseguir uma
resposta melhor, mudou para o banco vazio ao meu lado. Eu suspirei.
— O que você está bebendo? — ele perguntou.
Revirei os olhos e decidi encará-lo. Ele era tão bonito quanto o clima do
sul da Califórnia e não podia ser mais diferente de Jackson. Mesmo
sentado, dava para ver que era alto — pelo menos um metro e noventa. Os
olhos brilhavam em contraste com a pele bronzeada de sol. Embora
pudesse parecer ameaçador para a maioria dos homens, não senti que ele
poderia ser perigoso — pelo menos não para mim —, ainda que tivesse o
dobro do meu tamanho.
— Qualquer coisa que eu mesma esteja pagando — falei, sem tentar
esconder meu melhor sorriso paquerador.
Baixar a guarda para um belo desconhecido por uma hora era
justificável, sobretudo depois do sexto copo. Nós flertaríamos, eu ia
esquecer toda a culpa e seguir para casa. Talvez eu até ganhasse uma
bebida. Era um plano respeitável.
Ele sorriu de volta.
— Anthony — disse, levantando um dedo.
— O de sempre? — perguntou o barman na ponta do balcão.O homem assentiu. Era um cliente assíduo. Devia morar ou trabalhar
por perto.
Franzi o cenho quando Anthony pegou meu copo em vez de enchê-lo.
Ele deu de ombros, nenhum pedido de desculpa em seus olhos.
— Eu falei que era o último.
Em meia dúzia de goles, o desconhecido tomou uma quantidade
suficiente de cerveja barata para ficar pelo menos perto do meu nível de
bebedeira. Fiquei contente. Eu não teria que fingir que estava sóbria, e a
bebida que ele escolheu revelou que ele não era esnobe nem estava
tentando me impressionar. Ou talvez ele só estivesse sem grana.
— Você disse que eu não podia te pagar uma bebida porque o
Anthony te cortou, ou porque você não ia permitir? — ele perguntou.
— Porque eu posso pagar pelas minhas bebidas — falei, com a língua
um pouco enrolada.
— Você mora por aqui? — ele perguntou.
Dei uma olhada para ele.
— Sua habilidade de manter uma conversa está me decepcionando a
cada segundo.
Ele riu alto, jogando a cabeça para trás.
— Meu Deus, mulher. De onde você é? Não é daqui.
— Chicago. Acabei de chegar. As caixas ainda estão empilhadas na minha
sala de estar.
— Eu te entendo — ele disse, assentindo de um jeito compreensivo
enquanto segurava a bebida de modo respeitoso. — Fiz duas mudanças
para lados opostos do país nos últimos três anos.
— Pra onde?
— Para cá. Depois, Washington. E de volta para cá.
— Você é político ou lobista? — perguntei, forçando um sorriso.
— Nenhum dos dois — ele respondeu, a expressão se contorcendo em
repulsa, e deu um gole na cerveja. — Qual é o seu nome? — perguntou.
— Não estou interessada.
— Esse nome é horrível.
Fiz uma careta.
Ele continuou:— Isso explica a mudança. Você está fugindo de um cara.
Eu o encarei. O cara era bonito, mas também presunçoso — apesar de
estar certo.
— E não estou procurando outro. Nem uma ficada de uma noite só,
nem uma transa por vingança, nada. Então, não desperdice seu tempo nem
seu dinheiro. Tenho certeza que você consegue encontrar uma garota legal
da costa Oeste que ficaria mais que feliz em aceitar um drinque seu.
— E onde está a graça nisso? — ele perguntou, se aproximando.
Meu Deus, mesmo se eu estivesse sóbria, ele teria me embriagado.
Olhei para o modo como seus lábios tocavam o bico da garrafa de
cerveja e senti uma agulhada no meio das pernas. Eu estava mentindo, e ele
sabia.
— Eu te irritei? — ele perguntou, com o sorriso mais charmoso que eu já
tinha visto.
Com a barba bem feita e apenas alguns centímetros de cabelo castanho claro, aquele homem e seu sorriso certamente tinham vencido desafios
muito mais intimidantes que eu.
— Você está tentando me irritar? — perguntei.
— Talvez. Quando você fica com raiva, sua boca fica... incrível pra
caralho. Talvez eu aja feito um babaca a noite toda só pra poder apreciar a
sua boca.
Engoli em seco.
Meu joguinho tinha acabado. Ele tinha ganhado e sabia disso.
— Quer dar o fora daqui? — ele perguntou.
Fiz um sinal para Anthony, mas o desconhecido balançou a cabeça e
colocou uma nota alta sobre o balcão. Bebida grátis: pelo menos essa parte
do meu plano tinha funcionado. O homem seguiu até a porta, sinalizando
para eu seguir na frente.
— Aposto uma semana de gorjetas que ele não vai em frente com isso
— Anthony falou alto o suficiente para o belo desconhecido ouvir.
— Foda-se — falei, saindo rapidamente pela porta.
Passei pelo meu novo amigo e segui até a calçada, a porta se fechando
lentamente. Ele pegou a minha mão de um jeito brincalhão, porém firme, e
me puxou para perto.
— Parece que o Anthony acha que você vai dar pra trás — falei, olhando para cima, para seu rosto.
Ele era muito mais alto que eu. Ficar assim tão perto dele era como
sentar na primeira fileira do cinema. Eu tinha que erguer o queixo e me
inclinar um pouco para trás para olhar em seus olhos.
Eu me aproximei, desafiando-o a me beijar.
Ele hesitou enquanto analisava meu rosto, então seus olhos se
suavizaram.
— Algo me diz que, dessa vez, eu não vou.
Ele se inclinou, e o que começou como um beijo suave quase
experimental se tornou sensual e romântico. Seus lábios se moviam com os
meus, como se ele se lembrasse ou até sentisse falta deles. Diferentemente
de tudo que eu já experimentara, uma estranha corrente elétrica me fez
estremecer, derretendo meus nervos. Tínhamos feito isso tantas vezes antes
— em uma fantasia ou talvez em um sonho. Era o melhor tipo de déjà-vu.
Por menos de um segundo depois de ele se afastar, seus olhos continuaram fechados, como se ele estivesse saboreando o momento.
Quando ele me olhou, balançou a cabeça.
— Definitivamente não vou dar pra trás.
ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤ𝐁𝐄𝐋𝐀 𝐑𝐄𝐃𝐄𝐍ÇÃ𝐎
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